LIBIDO ESSENCIALMENTE COMO POTÊNCIA DE VIDA E CERCEAMENTOS INADEQUADOS DA MESMA

LIBIDO ESSENCIALMENTE COMO POTÊNCIA DE VIDA E CERCEAMENTOS INADEQUADOS DA MESMA

LIBIDO ESSENCIALMENTE COMO POTÊNCIA DE VIDA E CERCEAMENTOS INADEQUADOS DA MESMA

 

Clinamen, conatus, potência de agir, vontade, elan vital, ‘libido’, potência de vida… são designações para a força motriz que é intangível e que representa o elemento fundamental do existir. É a potência de vida em si, que leva o ser a existir como criatura de pensamento e ação. Pensamento como pulsão, instinto e/ou razão. Não é somente o elemento primordial para a existência da vida; é a vida em si, que não se percebe pelos sentidos.

 

A definição de vida não se encontra na consciência que, também, não pode ser definida como coisa, tampouco o que é, de fato. Conhecemos as suas consequências em reações físicas e comportamentais, provenientes do pensamento, que é coisa intangível, mesmo que com reações neurais perceptíveis pela atual tecnologia.

 

Percebemos as consequências da vida; desta potência de vida, que é a própria vida e potência de si, concomitantemente, mas a potência em si, não a conhecemos.

 

Consciência é a capacidade perceptiva temporal de passado, presente e futuro. Somos apenas passado, pois é o que compreendemos por ser completo em compreensão, por ser fato completo, por ter acontecido. O presente é uma limitação que criamos entre um ponto e outro do lapso temporal que se mantém ativo e, o futuro, é apenas um vislumbre baseado no perceber; no compreender o passado. O saber é, essencialmente, ancestral.

 

Qualquer ser que tenha determinismo de condutas e reações específicas ao que lhes impede de agir, visando se preservar, possui uma consciência, por mais rudimentar que seja. Esta consciência é o agir visando os propósitos de manutenção e reprodução para preservar a existência da própria espécie.

 

Cometemos um grave erro em entendermos que consciência é a que possuímos, por ser mais refinada, exatamente por amplificarmos a capacidade reativa na busca da autopreservação. A questão é que transformamos, ao longo da nossa evolução humana, a nossa consciência primordial em algo questionável, passando a chamá-la de inconsciente, que é uma força que depende da libido para nos dar reações instantâneas para nos preservarmos como espécie. A consciência humana passa a ser a previsão; o vislumbre do que pode acontecer, de acordo com cada ação e reação. É uma análise de causas e efeitos além da mera programação primordial.

LIBIDO ESSENCIALMENTE COMO POTÊNCIA DE VIDA E CERCEAMENTOS INADEQUADOS DA MESMA

Afirmarmos que somente nós, Seres humanos, possuímos uma consciência, é negarmos a existência de outros seres como vida, pois a consciência é ação ancestral visando fins específicos, para a preservação e perpetuação de uma espécie específica e do Todo. No nosso caso, este tipo de consciência passa a ser o inconsciente, existindo de uma maneira distinta, por controlar o agir e o próprio consciente, nos fazendo crer que a nossa razão é a grande controladora de nossas vidas, de maneira simplória. Em suma, o inconsciente, que é a consciência ancestral, manipula o nosso consciente, nos fazendo pensar que temos total controle de nossas vidas, exatamente por pensarmos e entendermos que este pensamento tem mera razão fria, sem nenhuma interferência do calor das pulsões, oriundas do inconsciente. Este é o maior engano que nós, Seres humanos, cometemos em relação a nós.

 

Poderíamos resumir como vivente aquele ser, de qualquer um dos cinco reinos conhecidos, que inicia a sua existência com base em herança genética e se mantém existindo com esta base, em comportamento que visa se preservar e reproduzir entre a própria espécie.

 

O que diferencia o Ser humano é a capacidade consciente mais refinada, afirmada, por alguns, oriunda do “processo cerebral” por nele se manifestar. No entanto, um ser unicelular procariota, possui vida; potência de vida e consciência, pois em seu existir, transfere a sua carga genética e tem comportamento ancestral visando a sua preservação, reprodução e manutenção dos elementos hereditários.

 

A consciência, deste ponto de vista, é algo que não pode ser aferido, partindo do princípio do solipsismo, que afirma que somente um ser pode experimentar a sua própria realidade. Por empatia, podemos imaginar a realidade do outro, mesmo não tendo as mesmas reações sensíveis. No entanto, por sermos organicamente diferentes, pelo solipsismo, não podemos, sequer, vislumbrarmos o que passa na consciência de um ser de outra espécie, tampouco vislumbrarmos as suas sensações, por serem absolutamente distintas às nossas.

 

O ponto crucial é que não há como negarmos que há ou não vida em um ser; se há ou não consciência, se não sabemos o que é a potência de vida e se somente podemos perceber a nossa própria consciência. Sequer sabemos como, de fato, a potência vida veio a surgir, que é algo que nos leva a uma investigação muito mais profunda, em termos ontológicos.

LIBIDO ESSENCIALMENTE COMO POTÊNCIA DE VIDA E CERCEAMENTOS INADEQUADOS DA MESMA

Um gameta é vida e consciência rudimentar, pois carrega a metade de um ser com potência a ser formado, com toda a potência de agir de um ser da sua espécie em sua completa plenitude.

 

Definir vida pela consciência humana é algo extremamente simplório. Definir vida pelo tamanho e multiplicidade celular, é absolutamente impossível, do ponto de vista biológico atual, dentro daquilo que se conhece nos cinco reinos; definir vida como consciência, baseada na consciência humana, é negar vida em qualquer outro ser, pois cada espécie possui características próprias; afirmar sentimento com base no que somos, prontos ou não, como Seres humanos, é negar o solipsismo e se afirmar capaz de ser outro ser e sentir e vislumbrar o que este outro ser experimenta.

 

Tudo aquilo que é afirmado como vida, não passa de consequências da mesma. Análises são necessárias, pois necessitamos de parâmetros para agirmos em nossas existências. Compreendemos que na falta da libido, as funções vitais deixam de existir e o corpo entra em decomposição. Há, então, a definição de morte. Mas não há, no entanto, a definição do elemento que levou a parada da existência material: a potência de vida que se ausentou. Esta potência não é quantificável, ao que podemos perceber. Imaginemos um ser de proporções nanométricas: possui vida, mas absolutamente distinta a que possuímos.

 

Não há ciência que possa definir a libido, até o presente momento. O que pode ser aferido é o estágio existencial e as consequências em cada um, oriundas da vida em si, mas não a presença da potência vida em si, tal como, em muitos casos, da sua ausência definitiva, tornando a morte, pelo menos em casos específicos, teoricamente reversível.

 

Qualquer debate sobre agir de uma forma ou de outra, tendo o elemento vida como base, ao invés de outros parâmetros, é vazia e essencialmente inútil, mesmo que aplicável positivamente em diversas práticas, por haver outros elementos que possam levar a utilidade prática, mas não a potência vida em si, pois o que não é conhecido e compreendido, não pode ser debatido. Os debates, que se referem à vida, devem se limitar as possibilidades de descoberta e compreensão da mesma e, não na sua qualificação baseada em suas consequências meramente sensíveis.

 

Por exemplo, definir o tempo de aborto com base na presença ou não de vida e de consciência, é debate com fundamentação vazia.

 

A definição do estágio existencial é um dos elementos que devem ser levados em conta, mas a libido e até mesmo a consciência, não, se forem tidos como elementos fundamentalmente únicos. Um feto, de qualquer espécie, em formação, está agindo ancestralmente pelas mensagens genéticas, a se preservar, existir e se reproduzir. Já tem a libido e a consciência rudimentar de preservação.

 

Afirmar uma consciência rudimentar não é afirmar sobre uma questão mística; religiosa ou congênere. É afirmar que há um conjunto de ações, baseadas no pretérito ancestral, com o fim de preservar um indivíduo de uma espécie para que se reproduza e mantenha este ciclo.

 

O debate deve ser mais profundo, com base na empatia e, não na imaginária capacidade de transferência perceptiva, lembrando que é algo impossível pelo solipsismo; pela individualidade de cada ser, seja ou não da mesma espécie.

 

O evitamento da progressão de um ser, antes da nidação, por exemplo, não implica em não haver vida ou consciência, mas sim, em não haver uma consciência e sentidos mais próximos aos que compreendemos. O cerceamento da libido sempre existirá. Não é um dizer que deve ou que não deve, mas uma realidade sobre o cerceamento de uma potência, mas que pode ser mais ou menos gravosa psicológica e fisicamente para quem cerceia e para a totalidade, se for em um estágio mais distante ao que podemos vislumbrar por empatia baseada em observações e percepções empíricas.

 

Cercear libidos é algo que nos é inevitável, para nos preservarmos. Enquanto existimos, a nossa simples homeostase é um conjunto de nascimentos e mortes celulares, que são vida em um conjunto de vidas que formam uma aparente vida única, dotada de consciência que a faz, no nosso caso, como Seres humanos, pensando sermos capazes de definirmos o existir de outrem.

 

Em questão ao aborto humano, em casos excepcionais, como violência sexual, nada mais viável que métodos imediatos de impedimento de gestação, como a “pílula do dia seguinte”, por exemplo. Se uma mulher está em risco de perder a vida e aceita abortar, haverá o cerceamento de uma vida em benefício de outra, cabendo a decisão a quem for mais capaz, isto é, a própria mãe ou, alguém que possa representá-la, quando a mesma não for capaz de se manifestar.

 

Definimos a nossa existência pela preservação de nossa espécie, com base nas nossas pulsões, que são as condutas ancestrais de preservação que chamamos de inconsciente. O prazer é a manifestação da ausência de perigo e, logo, o vislumbre da procriação e perpetuação da espécie. Daí o desejo sexual quase sempre aparecer em momentos de descontração e como mecanismo de defesa, em sublimação, em momentos de tensão emocional moderada. Na descontração, um impulso ancestral para procriar em um momento de segurança e, como sublimação, uma forma de sentir prazer e se sentir seguro, no mesmo momento que, inconscientemente, cumpre o dever da reprodução. As nossas ações inconscientes, direta ou indiretamente, nos leva à proteção e perpetuação da espécie.

 

Toda espécie luta por aquilo que lhe é fundamental na existência e na perpetuação da própria espécie. Se fomentarmos escapes de prazer, passamos a nos afastarmos, gradativamente, da realidade. Quando somos questionados sobre os nossos excessos de prazeres, revidamos violentamente, exatamente por termos criado uma confusão racional na consciência primordial, pois tentamos manter o prazer para nos sentirmos seguros em nossa manutenção existencial e perpetuação da espécie, de forma inconsciente, mas deixamos de perceber que estamos fugindo da realidade e nos tornando, cada vez, menos produtivos e até mesmo reprodutivos, em alguns casos.

 

Fomentar objetivamente a banalização de pulsões de prazer é permitir que o consciente, governado pelo inconsciente, se sinta capaz de levar a pessoa a agir de maneira que entenda racional, a banalizar os elementos essenciais à própria existência e perpetuação da espécie.

 

Se continuarmos a falar sobre o aborto, no que concerne a argumentação sobre a sua legalização, com base na potência de vida e consciência, não há um sim ou um não que possa ser objetivo.

 

Um sim, afirmaria a banalização do prazer, pois o ato sexual, por mais que tenha se tornado uma forma de proporcionar prazeres, se houver controle, se tornou necessário às pequenas fugas humanas, para nos relaxarmos e voltarmos à realidade com mais potência de agir em nossos propósitos. A única função ancestral do ato sexual é a procriação, para a perpetuação da espécie. Este impulso é forte, exatamente para que a razão não impeça o ato. Se houver uma racionalização sobre prós e contras de se ter uma prole, há grandes chances de uma desistência. O amor materno e paterno é tão forte, exatamente para que a perpetuação seja mantida, pois o aborto e o abandono pós-parto seriam absolutamente aceitos racionalmente, levando em conta prós e contras de se criar uma prole. É a nossa ancestralidade que nos mantém existindo. O desejo e o orgasmo que levam à perpetuação da espécie. Do contrário, a perpetuação dos animais não existiria. Podemos perceber em animais mais complexos uma forma de amor, isto é, uma doação empática movida por emoções e sentimentos, não explicáveis pela razão fria, mas algo absolutamente bem definido geneticamente em todos os seres mais complexos. O exercício sexual é uma forma de fomento à procriação nos Seres humanos. O ato puro sem fins reprodutivos não é fundamental à espécie em si. No entanto, se tornou, ao longo de nossa evolução, elemento necessário ao nosso bem-estar, exatamente por nos remetermos a uma sensação de dever cumprido e ao relaxamento posterior, proveniente do ato sexual. É uma mensagem ancestral de que estamos agindo de acordo com a nossa programação genética. É o que nos demonstra que a razão pode se sobrepor à formação ancestral, demonstrando a evolução comportamental, mas que é um conflito de titãs e que, nós, Seres humanos, devemos estar atentos à astúcia do titã mais experiente, que é o inconsciente.

 

Sobre o aborto, dizer um não é proporcionar grande potência de infelicidade. Infelicidade de um Ser oriundo de uma violência sexual ou que levou à perda da mãe, podendo ser responsabilizado futuramente. No entanto, dizer um não ao aborto como forma de manter as pulsões sob controle da razão, é viável para a espécie, de médio a longo prazo, na jornada evolucionária.

 

Há, no aborto, o cerceamento de uma libido que não é da mãe e nem de quem esteja concordando. O suicídio sim, é lidar com a própria libido. O aborto é lidar com libido de outro ser da mesma espécie. Como geneticamente estamos fadados a sermos Seres humanos, a diferença é que há um Ser humano em estágio inicial ou, a quem preferir, um ser com potência genética a ser um Ser humano.

 

Particularmente, compreendo que as duas formas firmadas juridicamente há muito de permissividade ao aborto são aceitáveis e viáveis, isto é, estupro e perigo de perda da vida da mãe, principalmente por partirem do consentimento. E os anencéfalos? É algo bastante complexo dizer um sim mais livre de dúvidas, dentro da grande variabilidade dos casos. O meu concordar é solipsista e não impositivo, tal como o concordar de outrem cabe a ele e não a mim.

 

Onde passa a residir o problema da negação da permissividade para atender ao mero orgasmo? Na sociedade, quando crianças e posteriores adultos vítimas do descaso, vierem a causar problemas. No entanto, na permissividade, o problema passa a residir no descaso com a vida, em um contexto geral e, no surgimento de pessoas que se entregarão ao mero prazer ancestral, pela incapacidade de lidar com a realidade, buscando sublimação em atos sexuais. Neste caso, há uma degradação da condição humana de autopreservação e até mesmo da diminuição da empatia, por haver priorização dos prazeres, que são personalíssimos e não sociais.

 

Sim e não são respostas para questões simplórias. Nunca são absolutos. Cabem em casos específicos. Uma permissividade é um sim absoluto e, uma não permissividade é um não absoluto. Não é tão simplório ao nível de dizer: “quem quiser fazer faça; quem não quiser, não faça”. São sins e nãos que atingem a totalidade na formação de um comportamento coletivo. Não é como dizer que eu quero ou não quero um bife de fígado acebolado.

 

Aqui surge o embate sobre a existência coletiva, que necessita de regras postas pelo Direito. Logo, necessitamos de um sim e de um não com características objetivas. O ponto é que o debate está com o foco errado. Está meramente no ato de abortar e, não nas causas da gravidez, na necessidade de cerceá-la ou não e, nos motivos geradores e consequentes de um sim ou de um não. Sem levar em conta que o elemento decisório, ao invés de ser a fase existencial se firma em uma impossível definição de haver ou não vida que deva ser considerada dotada de emoções e sensibilidade.

 

Percebamos que o problema reside no vício. Exatamente! No defeito de aceitar o gozo primordial como sendo algo acima de qualquer outra coisa pessoal ou coletiva. De não aceitar que o gozo primordial não é essencial à vida, a não ser que seja para procriação ou, que seja controlado como fomentador do bem-viver, com consciência de causas e efeitos. Logo, o aborto não é o problema em si, mas a incapacidade de autogestão; de autocontrole no que se refere às pulsões primordiais de busca de prazer. Sublimação, em termos psicanalíticos.

 

O problema da banalização sexual, na busca do gozo primordial, é causado pelo vazio existencial. Na falta de gozos distintos, o gozo primordial é buscado como sublimação, em uma forma de hedonismo “aristipiano” (hedonismo aético de Aristipo). Viver pela mera busca do prazer, de maneira aética, por ser o prazer maior que todas as coisas, tal como a coisa a ser buscada, pois representa a felicidade, é caminhar para a autodestruição e da sociedade em que a pessoa com estas características existe. Daí existirmos na ilusão da busca de uma felicidade constante e interminável, que é, de fato, impossível e que nos leva a infelicidade profunda, nos fazendo buscarmos fugas e, o gozo primordial, é o mais intenso e mais simples de se conseguir. Na atualidade, há um exagero em chamar justificativas subjetivas, grupais ou não, de razão. São argumentos solipsistas que sustentam não elementos essências à manutenção da potência vida, mas sim, a manutenção do gozo, principalmente o primordial.

 

Há um meio termo? Sim, há! Mas como toda solução, é subjetiva, mesmo que dita objetiva e, somente é funcional em longo prazo.

 

Há uma teia de elementos envolvidos. Por este motivo, a formação humana passa a ser o primeiro caminho, dando novos horizontes às pessoas e aos seus gozos, que passam a ser variados e o gozo primordial passa a ser um exercício saudável, com “parceiros (as) certos (as)”, no sentido de haver segurança ampla e, não mera parceria para gozar. O excesso de parceiros (as) sexuais é um forte indício de busca pela sublimação, pois o gozo primordial em si já não mais sustenta e, então se buscam novos complementos, como parceiros (as) e fetiches que, em médio prazo, deixam de saciar, levando as pessoas a explosões de violências mal direcionadas, sem motivação aparente, pelo fato dos motivos residirem apenas na mente conturbada de quem se perdeu na impossibilidade de se sublimar sexualmente, pelos excessos e quase total falta de parâmetros essencialmente limitadores.

 

A formação humana, levando a uma ampliação de visão de mundo, diminui a necessidade de atos sexuais como fuga, feitos maneiras inconsequentes. Isso não implica em quantidade e intensidade, mas em capacidade de autogestão; de autocontrole. Um casal pode ter duas, três ou mais relações sexuais diariamente, sem que estejam sendo movidos por pulsões viciantes. Podem estar apenas interagindo entre si para um bem-viver, ao invés de estarem fugindo da realidade com sublimação associada. A sublimação associada é a união de duas pessoas apenas para o atendimento da necessidade de fuga da realidade pelo gozo primordial (orgasmo), sem maiores interações e compromissos. De fato, uma grande perda nas relações humanas, pela diminuição da potencialidade dos tantos gozos que podem existir, tal como do gozo primordial regado a emoções e sentimentos mais profundos.

 

Havendo esta mudança humana, pode haver a permissividade jurídica do aborto de maneira objetiva, pois cada pessoa tenderá a assumir que há o cerceamento de uma potência de vida, independente do estágio existencial. Tal como deverá haver para o médico, o poder de escolha de agir ou não em tal situação, quando não houver risco de perder a vida da mãe, pois o dever do médico é salvar vidas e, não de cerceá-las pela mera vontade de alguém, escorada em normatizações.

 

Em relação ao tempo hodierno, não é nada incomum filhos indesejados passarem a ser amados, tal como filhos desejados passarem a ser odiados. O futuro é somente vislumbre, baseado em passado. A razão humana, ao invés de ser utilizada para adivinhações, prevendo futuros, deveria ser voltada a criar soluções diferentes das bases de vislumbre que são inadequadas. O passado, dando proposições de resultados negativos, deve ser trabalhado racionalmente, com vislumbres na busca de resultados melhores, para que quando se tornem passados, sejam aproveitados com mais facilidade, por já estarem prontos. O que gera o medo da mudança severa é exatamente a incapacidade de vislumbrar ações que confrontem pulsões consideradas relativamente fortes. É a incapacidade da pessoa vencer a si, objetivando tal coisa, por haver uma herança objetiva, mesmo que transformada em subjetiva ao longo da construção da cosmovisão de cada pessoa.

 

Em relação a minha opinião pessoal sobre a legalização do aborto, sou contra, exatamente por temer pela potência vida que não compreendo o que é e as suas diversas formas de consciência, tal como as consequências de uma permissividade legal, me ser vislumbrada muito mais inadequada que uma não permissividade. No entanto, por não ser uma opinião de cunho religioso, não condeno quem o faça, pois somente o solipsismo cabe em tal decisão. Então poderia parecer que tenho tendência à permissividade? Não, não tenho. Como dito, a minha negação se pauta na incapacidade de compreender o que é a libido e a consciência primordial, tal como a própria consciência humana e, tal como percebo uma total alteração no inconsciente coletivo, com base na pseudo razão que nega a consciência ancestral (inconsciente). Por este motivo, digo não ao aborto pela mera liberação da saciação do gozo primordial. E não condeno quem o faça, por não possuir bases religiosas ou místicas em minhas convicções, mesmo achando arrepiante um ser em desenvolvimento ser cerceado de sua potência formadora e, não aceitaria a hipótese de participar, presenciar ou aceitar, dentro do que me fosse possível, uma mulher abortar um filho meu, tenha sido programado ou não, ressalvando-se o caso de grave perigo à mãe que, neste caso, não poderia afirmar as sensações e emoções, por nunca tê-las sentido e torço para que não as sinta, sabendo que seriam nada prazerosas.

 

Não concordo com a legalização do aborto, pois vislumbro a perda total da capacidade de autogestão e autocontrole, pela banalização da vida em potência, em prol do mero prazer. Esta conduta leva, potencialmente, a outras que afetam o Todo e, não somente a quem aborta e a quem concorda. A formação de um grupo de pessoas em seu inconsciente coletivo, não pode servir de base para outro grupo culturalmente diferente, de outro país, especificamente. Devemos nos pautar no grupo em debate e, não em outro que possa ter tido sucesso. Certamente, encontraremos outros elementos que irão demonstrar os motivos de resultados distintos, se é que existe sucesso baseado em tal questão que possa perdurar por longo período.

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Seria impossível não ser empático com mulheres e homens que tenham se descuidado no momento de forte prazer e causado uma potencial gestação, quando têm impossibilidades diversas de assumirem o Ser humano que promete vir. Por este motivo não condenaria tal casal, mas não concordaria que fosse legalizado por causa de casais assim, pois a legalização afetaria as pessoas que têm relações sexuais como fugas e concordaria com a banalização do assassinato da libido.

 

E em relação a estes casais que cometeram um descuido? Na iminência de um descuido, “pílula do dia seguinte”. E quem não tem como conseguir? Convenhamos que quem estiver sem condição de acesso a uma pílula, em tese, estará sem condição de acesso a um procedimento abortivo seguro. Logo, legalização, em um caso como este, pouco serviria, já que um dos tantos argumentos é a segurança da vida da mulher e, não ética em fazer ou não fazer o que a lei determina, tampouco moralidade, principalmente religiosa. Havendo a afirmação de que se fosse legalizado, o casal não necessitaria de condições financeiras, pois seria gratuito. O problema passa a residir na ineficiência do sistema público de saúde, que não conseguiria atender a tanta demanda e colocaria em risco o procedimento abortivo pela espera por vagas, inclusive, dando atendimento a abortos ao invés de patologias. É algo que poderia prejudicar mais ainda os tantos enfermos que já não conseguem ser atendidos sem aborto legalizado e feito pelo sistema público de saúde.

 

O meu veredito é o não, mas em relação a mim e desejando que se estenda a outrem, quando não for essencial o aborto. No entanto, pelo solipsismo não me vejo capaz de condenar moralmente quem seja a favor, tal como quem o faça ou já o tenha feito. Particularmente, conheço diversas mulheres que já fizeram e se arrependeram amargamente. Poucas são as que se fazem de neutras. Algumas se tratam para conviverem com uma decisão que tomaram, mesmo achando correta na época. Outras, de fato, entendem com absoluta naturalidade que o que fizeram foi o correto, mesmo que seja uma pequena parcela. Diversidade é uma característica humana.

 

Em relação aos homens que não são levados em consideração neste debate, mas são responsáveis por vinte e três cromossomos, fundamentais à formação de outro ser da espécie humana, são tão diversos em opinião quanto às mulheres. A gestação de um homem acontece na mente, em suas emoções e sentimentos. Não pode experimentar o que uma mulher experimenta, tal como uma mulher não pode experimentar o que um homem experimenta e, logo, uma mulher não pode se julgar capaz de questionar os sentimentos e emoções de um homem. Daí haver muitos embates, quando o homem deseja o aborto e a mulher não, sendo considerado uma violência e, o que pouco se fala, é quando o homem não deseja o aborto e a mulher sim. Seria uma violência um homem impedir a mulher fisicamente de abortar para salvar a vida da cria? Não ouvi debate sobre tal coisa, mas conheço diversos casos de homens emocionalmente comprometidos, vítimas de abortos que não desejaram e de alguma forma não permitiram, mas que não puderam intervir. Não conheço proposições para legalização do aborto que necessitem da anuência do homem e da mulher, para casos de mera negação à prole, sem necessidades reais de abortar. Não há somente um lado envolvido. Neste ponto que afirmo que, mesmo havendo legalização do aborto, sem que seja por necessidade de sobrevivência da mãe, para ser legalizado, o pai deve consentir, se este for conhecido.

 

Homens sofrem vigorosamente pelo sentimento atávico de proteção da prole não ter sido cumprido. É um trauma vigoroso acontecido em homens que desejavam a prole e mulheres a abortaram. Tão traumatizante, dentro do aspecto interno e potencial, obviamente divergindo nos fatos, quanto uma mulher que deseja o filho e se relaciona com um homem que nega o seu dever paterno. Este sim é o aborto masculino, alegoricamente falando. Tão abominável quanto o aborto feminino, quando pelo mero prazer. Inclusive, em tese, mais perverso em potência, pois o aborto masculino direciona o sofrimento à prole, que se torna existente para a mãe, mesmo esta prole tendo sido negada pelo genitor. É inegável que o alegoricamente chamado aborto masculino acaba sendo potencialmente mais perverso, pois progride no tempo e em variabilidade de eventos. A questão é: se é permitido o aborto para uma mulher, alegoricamente falando, o aborto para um homem potencialmente poderia ser exigido legalmente, pois poderia argumentar que é dono de si e que gera as suas próprias regras, em relação a si. Que quem gerou foi a mulher, porque quis e que ele apenas a fecundou. Sobre a existência da prole, argumentaria, que caberia apenas à mãe, que decidiu tê-la, mesmo sabendo que o genitor não a desejava. Se uma mulher deseja o aborto, terá que permitir que o pai abandone, em um aborto simbólico. Do contrário, haverá regra prejudicial à parte masculina, essencialmente envolvida na procriação. É por isso que a permissibilidade do aborto sem necessidade de preservação da vida é inadequado e pessoalmente vejo como abominável, mesmo que não condenável. O abominar é baseado em entendimentos pessoais e a condenação é exteriorizada em ações repreensivas.

 

São tais embates que devem ser compreendidos para que a escolha de parceiros (as) não seja para mero atendimento de sublimações, pois quando estes embates acontecem, não há soluções simples. Sempre haverá alguém sofrendo.

 

Muitos que nascem com potencial possibilidade de sofrerem por falta de amor, acabam sendo amados por quem pensava não amar ou, por outros que venham a surgir. Da mesma forma, outros que potencialmente nascem para ser amados, se tornam menosprezados e até mesmo odiados. Não é a genética que faz a maternidade e a paternidade. A genética faz, apenas, genitores. A paternidade e a maternidade estão além do genoma; de uma mera herança genética; de genótipos e fenótipos.

 

Alegar que uma criança abandonada sofreria e que o aborto é a sua solução, não deixa de ter uma motivação à negação de responsabilidades diversas na existência de uma pessoa, criando um caráter vil, disfarçado em bondade e pseudo empatia, consequente de transferências, como mecanismo de defesa. Inclusive, por simples ardil. Quem vive socialmente falando sobre auxílio ao próximo e se diz empático (a) e tem condição de criar uma criança abandonada e não o faz e, ainda aborta, é necessariamente hipócrita em relação a sua dita empatia. Além de negar a evolução de uma vida, nega o auxílio à outra. Não é bondade, mas sim, engodo, na busca da mera sublimação.

 

Não é simplório lidar com a vida, exatamente por ela não ser compreendida e por estarmos lidando com a potência de outrem. Se o argumento é aumento de população e escassez recursos naturais, suicídio seria uma solução também, mas não há voluntariado para esta nobre causa.

 

Complexo, sem dúvida, mesmo que aceitável e potencialmente necessário em alguns casos, é abominável como mero fomento do prazer desmedido, pois desta forma, afeta a totalidade e, não somente a um ser cerceado de sua libido.

 

Sins e nãos absolutos em tal debate são ainda inviáveis, pois os elementos debatidos são pobres e, outros que deveriam estar no debate, sequer são percebidos.

 

Autor: Carlos Alexandre Costa Leite

 

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